22 de dezembro de 2012

VOLTA ÀS LIVRARIAS “A COMÉDIA HUMANA” DE BALZAC

A segunda edição brasileira de “A Comédia Humana”, publicada nos anos 1980 e 1990 pela editora Globo, tinha uma característica única dentre todas as edições mundiais da enorme obra de Honoré de Balzac: o prefácio ficava ao final do 17º e último volume.
Foi a saída que o crítico Paulo Rónai (1907-1992), após revisar à distância o trabalho que organizara quatro décadas antes, encontrou para solucionar um lapso da editora, que esquecera de incluir a apresentação do francês.
“Rónai recebeu o livro impresso em seu sítio em Nova Friburgo - RJ e notou a falta do texto”, lembra Eliana Sá, então editora-executiva da Globo. “Disse: ‘Não se preocupe. Transforme em posfácio, no último volume. Teremos uma edição só nossa’.”
Agora, com o lançamento dos primeiros quatro volumes da terceira edição da obra completa de Balzac, pelo selo Biblioteca Azul, da Globo, o prefácio retorna ao lugar de direito, abrindo a coleção.
A nova reedição resgata, após anos fora de catálogo, as 88 histórias, entre romances e novelas, às quais Balzac dedicou a vida e cuja organização pelo húngaro-brasileiro Rónai é considerada das melhores do mundo.
A revisão técnica ficou com Gloria Carneiro do Amaral, que respeita as correções feitas nos anos 1990 por Rónai.
“Desde os anos 1950, ele anotava erros que gostaria de corrigir”, diz o diretor editorial Marcos Strecker. “Tentou reeditar nos anos 1970, mas só quando a Globo gaúcha foi comprada pelas organizações Globo, nos anos 1980, surgiram condições para isso”.
Junto aos quatro primeiros livros, que têm histórias como “O Pai Goriot” e “A Mulher de Trinta Anos”, sai o volume “Balzac e a Comédia Humana”, com ensaios do crítico incluindo o inédito “A Comédia Humana no Brasil: História de uma Edição”.
Nesse texto, Rónai conta como o convite, em 1943, para apresentar “A Comédia Humana” virou um contrato para organizar para a Globo a coleção traduzida por nomes como Mario Quintana, Ernesto Pellanda e Dorval Serrano.
Todos eles, escreveu sobre os cerca de 20 tradutores, eram excelentes. “Apenas tinham iniciado sem diretrizes. A mesma personagem de vários romances da 'Comédia’ surgia ora com nome francês, ora com nome português. A mesma rua de Paris tinha denominações diferentes”.
Organizar “A Comédia Humana” já não havia sido fácil para Balzac (1799-1850), que tinha parte das narrativas publicadas quando resolveu criar laços entre elas, com personagens reincidentes nas tramas.
Esse desafio, que o levou a reescrever as histórias por toda a vida, juntou-se a sua ambição de ser um “historiador de costumes”, investigando o tempo em que vivia.
Balzac pagou o preço da originalidade. Como escreve Rónai, foi “negado pela quase unanimidade da crítica séria enquanto vivo”. O esforço feito hoje para devolver a obra ao público é só uma prova de que valeu a pena ambicionar um lugar entre os gênios da literatura.


Por Raquel Cozer
Colunista da Folha

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