A segunda edição
brasileira de “A Comédia Humana”, publicada nos anos 1980 e 1990 pela editora
Globo, tinha uma característica única dentre todas as edições mundiais da
enorme obra de Honoré de Balzac: o prefácio ficava ao final do 17º e último
volume.
Foi a saída que o
crítico Paulo Rónai (1907-1992), após revisar à distância o trabalho que
organizara quatro décadas antes, encontrou para solucionar um lapso da editora,
que esquecera de incluir a apresentação do francês.
“Rónai recebeu o
livro impresso em seu sítio em Nova Friburgo - RJ e notou a falta do texto”,
lembra Eliana Sá, então editora-executiva da Globo. “Disse: ‘Não se preocupe.
Transforme em posfácio, no último volume. Teremos uma edição só nossa’.”
Agora, com o
lançamento dos primeiros quatro volumes da terceira edição da obra completa de
Balzac, pelo selo Biblioteca Azul, da Globo, o prefácio retorna ao lugar de
direito, abrindo a coleção.
A nova reedição
resgata, após anos fora de catálogo, as 88 histórias, entre romances e novelas,
às quais Balzac dedicou a vida e cuja organização pelo húngaro-brasileiro Rónai
é considerada das melhores do mundo.
A revisão técnica
ficou com Gloria Carneiro do Amaral, que respeita as correções feitas nos anos
1990 por Rónai.
“Desde os anos
1950, ele anotava erros que gostaria de corrigir”, diz o diretor editorial
Marcos Strecker. “Tentou reeditar nos anos 1970, mas só quando a Globo gaúcha
foi comprada pelas organizações Globo, nos anos 1980, surgiram condições para
isso”.
Junto aos quatro
primeiros livros, que têm histórias como “O Pai Goriot” e “A Mulher de Trinta
Anos”, sai o volume “Balzac e a Comédia Humana”, com ensaios do crítico incluindo
o inédito “A Comédia Humana no Brasil: História de uma Edição”.
Nesse texto, Rónai
conta como o convite, em 1943, para apresentar “A Comédia Humana” virou um
contrato para organizar para a Globo a coleção traduzida por nomes como Mario
Quintana, Ernesto Pellanda e Dorval Serrano.
Todos eles,
escreveu sobre os cerca de 20 tradutores, eram excelentes. “Apenas tinham
iniciado sem diretrizes. A mesma personagem de vários romances da 'Comédia’
surgia ora com nome francês, ora com nome português. A mesma rua de Paris tinha
denominações diferentes”.
Organizar “A
Comédia Humana” já não havia sido fácil para Balzac (1799-1850), que tinha
parte das narrativas publicadas quando resolveu criar laços entre elas, com
personagens reincidentes nas tramas.
Esse desafio, que
o levou a reescrever as histórias por toda a vida, juntou-se a sua ambição de
ser um “historiador de costumes”, investigando o tempo em que vivia.
Balzac pagou o
preço da originalidade. Como escreve Rónai, foi “negado pela quase unanimidade
da crítica séria enquanto vivo”. O esforço feito hoje para devolver a obra ao
público é só uma prova de que valeu a pena ambicionar um lugar entre os gênios
da literatura.
Por Raquel Cozer
Colunista da Folha
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