Nos anos 1970, os defensores dos direitos das
mulheres tinham muitas dúvidas em relação à mastectomia. Eles afirmavam que os
cirurgiões – grupo que na época era formado quase que somente por homens –
removiam as mamas rápido demais após o diagnóstico de câncer.
Mas hoje as coisas mudaram. Uma nova geração
de mulheres exige que os médicos utilizem abordagens mais agressivas, e um
número cada vez maior vem pedindo a retirada até de mamas saudáveis com o
intuito de evitar o surgimento de um câncer.
Os pesquisadores estimam que até 15 por cento
das mulheres com câncer de mama – 30 mil casos ao ano – optam por retirar as
duas mamas, decisão que, no final dos anos 1990, era tomada por 3 por cento das
mulheres. Aparentemente a grande maioria dessas mulheres nunca realizou testes
ou recebeu aconselhamento genético e toma a decisão com base em um medo
exagerado de risco de reincidência.
Além disso, os médicos afirmam que é cada vez
maior o número de mulheres que pede para se submeter à mastectomia sem ter
recebido diagnóstico de câncer, amparadas pela existência de um risco genético.
(Essas mulheres não constam dos bancos de dados de registro de câncer, por isso
seu número é desconhecido).
“O que enfrentamos é quase uma epidemia de
mastectomia profilática”, afirmou a Dr. Isabelle Bedrosian, oncologista
cirúrgica do Centro Oncológico M.D. Anderson, em Houston. “Eu acredito que a
comunidade médica tenha notado. Por que as mulheres têm optado pela cirurgia,
se não temos dados que expressem essa necessidade do ponto de vista oncológico?”
Um dos motivos talvez sejam as campanhas
intermináveis de conscientização que incutiram nas mulheres um medo permanente
da doença. É possível que os aprimoramentos das cirurgias de reconstrução
também estejam contribuindo com essa tendência, bem como o anúncio público de
celebridades sobre a decisão de realizar a mastectomia preventiva.
Allyn Rose, 24 anos, representante do estado
de Washington D.C. no concurso Miss Estados Unidos, esteve nas manchetes este
mês, quando anunciou seus planos de remover as duas mamas após o concurso. A
mãe e a avó da modelo morreram de câncer de mama. A personalidade televisiva
Giuliana Rancic, 37 anos, e a atriz Christina Applegate, 41 anos, também
anunciaram publicamente que realizariam a mastectomia dupla após receberem o
diagnóstico de câncer de mama em estágio inicial.
‘Não encontraremos outros órgãos que as
pessoas retirem do corpo porque estão preocupadas em relação a uma doença’,
afirmou o historiador da área médica Dr. Barron H. Lerner, autor do livro ‘The
breast cancer wars’ (2001). ‘Como o câncer de mama possui grande carga
emocional e recebe muita atenção, eu acredito que as mulheres às vezes se
sintam obrigadas a agirem da forma mais proativa possível. Essa é uma
característica social da doença.’
A maior parte dos dados sobre mastectomia
profilática é da Universidade de Minnesota, onde os pesquisadores estudaram as
tendências de realização da mastectomia contralateral (remoção da mama saudável
junto com a mama afetada) de 1998 a 2006. O Dr. Todd M. Tuttle, chefe de
cirurgia oncológica, afirmou que as taxas de mastectomia dupla mais que
dobraram no período e essa tendência não apresentou sinais de diminuição.
A partir dessas tendências e fazendo uso de
relatórios sem comprovação científica, Tuttle estima que pelo menos 15 por
cento das mulheres que receberem o diagnóstico de câncer de mama se submeterão
à retirada também da mama saudável. ‘São as mulheres mais jovens que estão
fazendo isso’, afirmou.
O risco de mulheres com câncer de mama
desenvolverem câncer na outra mama é de aproximadamente 5 por cento ao longo de
10 anos, afirmou Tuttle. Mas um estudo realizado pela Universidade de Minnesota
descobriu que as mulheres estimam que esse risco seja de mais de 30 por cento.
‘Eu acredito que existam mulheres que
superestimem de forma acentuada o risco de terem câncer’, afirmou.
A maioria dos especialistas concorda que a
mastectomia dupla é uma opção razoável para as mulheres com risco genético
acentuado e que possuam o gene de câncer de mama. Esse foi o caso de Allison
Gilbert, de 42 anos, escritora do condado de Westchester, em Nova York, que
descobriu o risco genético após perder a avó para um câncer de mama e mãe para
um câncer de ovário.
Mesmo assim, ela adiou a decisão de realizar
a mastectomia preventiva até perder a tia para uma forma agressiva de câncer de
mama. Ela realizou uma mastectomia dupla em dezembro. (A escritora já havia
removido os ovários).
‘Eu acreditava que as mulheres de minha
família não tinham como evitar a fatalidade’, afirmou Gilbert, autora do livro ‘Parentless
parents’ (2011), sobre como os pais de uma pessoa influenciam na forma como ela
criar seus filhos. ‘Aqui tive uma oportunidade maravilhosa de saber o que tenho
e de agir em relação a isso e, se Deus quiser, estarei presente mais tempo na
vida de meus filhos’.
Mas ela afirma que a decisão não foi tomada
facilmente. A mastectomia dupla e a reconstrução exigem uma cirurgia de no
mínimo 11 horas e meia e recuperação intensa. Ela obteve aconselhamento
genético, participou de um grupo de apoio e examinou suas opções.
Contudo, os médicos afirmam que muitas
mulheres não estão assim tão bem informadas ao tomar a decisão. No mês passado,
pesquisadores da Universidade de Michigan divulgaram um estudo envolvendo mais
de 1.446 mulheres que tiveram câncer de mama. Quatro anos depois do
diagnóstico, 35 por cento pensavam em remover a mama saudável e 7 por cento já
a tinham removido.
Notadamente, o risco de reincidência de
câncer não era alto para a maioria das mulheres que retiraram as duas mamas. Na
verdade, os estudos sugerem que a maioria das mulheres que se submetem à
mastectomia dupla nunca realiza testes ou busca aconselhamento genético.
‘O câncer de mama toca muito o sentimento das
pessoas, e elas percebem a mama diferentemente de um braço ou uma parte
necessária do corpo que utilizamos todos os dias’, afirmou Sarah T. Hawley,
professora adjunta de medicina interna da Universidade de Michigan. ‘As
mulheres sentem que têm total escolha sobre essa parte do corpo, e dizem:
'quero deixar o problema para trás, não quero mais ter que me preocupar’.
Fonte: The New York Times News
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