Solucionar o mistério de como moedas africanas de
900 anos acabaram parando na remota Austrália poderia não só recontar a
história do contato de estrangeiros no país, como também lançar luz sobre a
arte rupestre aborígine.
O enigma de como as antigas moedas Kilwa, que
segundo se acredita remontariam a 1.100 anos, foram parar nas Ilhas Wessels, na
costa do Território do Norte, onde foram descobertas em 1944, sempre levantou
questionamentos sobre as visitas estrangeiras nas longínquas costas
australianas.
Ian McIntosh, professor australiano de antropologia
na Universidade de Indiana-Purdue, nos Estados Unidos, explicou que o trabalho
rupestre encontrado nas ilhas, que inclui uma imagem que parece mostrar um tipo
de barco a vela europeu, poderia dar algumas pistas.
“Grande parte da próxima etapa será documentar,
datar e interpretar (as obras de arte), juntamente com os povos
aborígines”, disse à AFP McIntosh, de sua casa, em Indiana.
As moedas Kilwa foram encontradas na areia pelo
operador de radar da Força Aérea Real Australiana Maurie Isenberg, durante a
Segunda Guerra Mundial, quando ele estava estacionado na ilha, no momento em
que o conflito no Pacífico eclodiu.
No total, ele encontrou nove moedas, cinco peças de
cobre africanas e quatro moedas holandesas de origem europeia, não tão antigas
quanto as primeiras. Inicialmente, Isenberg tentou vender as moedas, mas não
teve sucesso. Ele, então as guardou durante décadas até que, em 1979, as enviou
a um museu para identificação, juntamente com um mapa mostrando onde as
encontrou.
Segundo McIntosh, existiam várias teorias sobre as
moedas, inclusive a de que elas teriam sido arrastadas para a costa após um
naufrágio. Sabe-se que navegadores europeus passaram pela costa da Austrália
nos anos 1600, mas foi só quando o capitão James Cook aportou na Baía Botany,
em Sydney, em 1770, que a Grã-Bretanha reivindicou o território.
As moedas - que segundo se acredita teriam se
originado no sultanato medieval de Kilwa, uma região onde hoje fica a Tanzânia
- levaram à especulação de que áreas do norte da Austrália foram visitadas por
outros navegadores vindos de regiões tão distantes quanto o Oriente Médio e a
África. De acordo com um artigo recente de McIntosh,
publicado no periódico Australian Folklore, sobre a cadeia de eventos
que levou à descoberta, “o argumento para o envolvimento dos comerciantes Kilwa
e também dos portugueses é bastante atraente”.
Ele observou que a rota marítima de Kilwa, no leste
da África, a Omã e dali para a Índia, a Malásia e vizinha próxima da Austrália,
a Indonésia, era bem estabelecida nos anos 1500 e provavelmente durante centenas
de anos antes disso.
McIntosh disse que vários membros de sua equipe
acreditavam que as moedas tinham, simplesmente, sido arrastadas para a costa,
mas admitiam que esta não era a única teoria possível. Segundo o acadêmico, uma explicação poderia ser que
um indonésio conhecido, sobrevivente de um naufrágio que viveu nas Ilhas
Wessels, poderia ter trazido as moedas para a região. As moedas, ele especulou,
podem ter representado a “riqueza global” deste homem. McIntosh afirmou ainda que uma expedição conduzida
por ele em julho para o local onde as moedas foram descobertas e que envolveu
intenso trabalho de buscas no terreno acidentado não resultou na descoberta de
novas moedas.
“Durante os últimos anos nós desenvolvemos uma
série de hipóteses para explicar como aquelas moedas podem ter saído do leste
da África e chegado no norte da Austrália”, afirmou. “A questão central da
pesquisa neste ponto inicial foi tentar obter evidências suficientes que
levassem a direções específicas”, acrescentou.
O que os cientistas de fato encontraram nas
escavações foi trabalho rupestre aborígine e alguma evidência potencial de
naufrágios - uma ideia nada improvável, em vista dos perigosos arrecifes no
entorno da ilha - na forma de um pedaço de 1,80 metro de madeira de uma
embarcação.
McIntosh disse que os cientistas trabalharão com
povos aborígines para analisar as obras de arte e ver se combinam com quaisquer
tipos conhecidos de barcos, acrescentando haver histórias de interação no
passado com “povos diferentes, brancos e negros de outros lugares, não
aborígines”. “Provavelmente, estas moedas ficaram em circulação
por duas centenas de anos, mas apenas na região do leste da África, pois para
além deste local não tinham valor”, disse McIntosh, acrescentando que outras
moedas do tipo só foram encontradas no Zimbábue e em Omã. “Em nenhum outro lugar do mundo foram encontradas,
com exceção do norte da Austrália”, disse McIntosh. “É muito incomum. É isto
que deixa todo mundo intrigado”.
Fonte: terra.com
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