Os vetos do
Planalto e do Ministério da Saúde a campanhas de aids e material educativo
escolar ressuscitam uma polêmica superada há décadas: a de que é possível
controlar a epidemia sem quebrar tabus e enfrentar preconceitos. A experiência
mundial mostra que, quando as ações não tiveram por base os direitos humanos, a
evidência científica, a garantia do acesso universal à saúde e a priorização de
grupos sociais mais atingidos, a epidemia cresceu, mais pessoas morreram e os
custos com a saúde aumentaram.
É um engano achar
que a epidemia de aids é causada somente por um vírus e bastam informações para
que todos adotem medidas de prevenção. A epidemia é bem mais complexa. Já na
década de 1980, a Organização Mundial da Saúde alertava que o preconceito, a
discriminação e as desigualdades sociais eram as principais causas do
alastramento da doença no mundo. São eles que impedem mulheres de negociar o
uso de preservativo, os homossexuais de exercer sua sexualidade de forma segura
e as prostitutas de enfrentar as situações de violência que as expõem com maior
intensidade ao HIV.
Foi com base nesse entendimento, na capacidade de estabelecer diálogos francos com a sociedade e na adoção incondicionada do princípio constitucional da laicidade que a política de aids avançou nesses 30 anos. E não foram poucas as conquistas. Há mais de 20 anos, as primeiras campanhas sobre o preservativo foram assistidas pelas famílias brasileiras no horário nobre, as primeiras seringas foram distribuídas aos usuários de drogas e as primeiras aulas sobre sexualidade e aids foram ministradas em escolas. E por que não se lembrar da ousadia de enfrentar o lobby da indústria e adotar a licença compulsória de medicamentos antirretrovirais?
Foi com base nesse entendimento, na capacidade de estabelecer diálogos francos com a sociedade e na adoção incondicionada do princípio constitucional da laicidade que a política de aids avançou nesses 30 anos. E não foram poucas as conquistas. Há mais de 20 anos, as primeiras campanhas sobre o preservativo foram assistidas pelas famílias brasileiras no horário nobre, as primeiras seringas foram distribuídas aos usuários de drogas e as primeiras aulas sobre sexualidade e aids foram ministradas em escolas. E por que não se lembrar da ousadia de enfrentar o lobby da indústria e adotar a licença compulsória de medicamentos antirretrovirais?
Agora, a posição
governamental aponta para uma perigosa mudança de caminho, afastando-se da
experiência bem sucedida e do conhecimento técnico. Abre-se assim a
possibilidade real de um agravamento da epidemia no país. A censura à campanha
para homossexuais no carnaval de 2012 deixou de abordar o segmento mais atingido
pela doença no país, com taxas de infecção 11 vezes superiores à da população
geral. A proibição do uso de material educativo escolar endossado pela Unesco e
Unaids, no início deste ano, poderá contribuir para criar uma geração inábil
para lidar com a prevenção da aids. E a recente censura à campanha dirigida a
prostitutas deixa no limbo um grupo que representa entre 10% e 15% das mulheres
infectadas pelo HIV no país. Mais do que isso, essa censura sinaliza para a
sociedade a intolerância com o exercício da prostituição, aumentando a
marginalização e as situações de violência contra esse segmento. As
consequências serão negativas para toda a sociedade, incluindo os clientes e
companheiras e mulheres dos clientes.
Isso ocorre em um
momento em que a aids dá sinais de que volta a crescer no país, uma situação
que contrasta com o cenário internacional. As Nações Unidas, em seu último
relatório, chamaram a atenção para o fato de que tecnologias altamente efetivas
e disponíveis podem levar ao fim da epidemia ainda nesta década.
Diante disso, o
Ministério da Saúde deverá decidir de que lado estará. Um programa de aids
influenciado por um lobby conservador e interesses políticos terá pouca chance
de sucesso e representará uma ruptura com as experiências bem sucedidas e com a
sociedade brasileira.
Fonte: revista-radis/130/
Por: Pedro
Chequer, Paulo Teixeira e Alexandre Grangeiro
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